Comunidade marítima discute os desafios da navegação na região Norte

Os desa­fi­os da nave­ga­ção com o aumen­to do trá­fe­go e do tama­nho das embar­ca­ções na região Norte foi o prin­ci­pal tema do 41º Encontro Nacional de Praticagem, em Belém. Por isso, prá­ti­cos de todo o Brasil e repre­sen­tan­tes da Marinha e de uni­ver­si­da­des tro­ca­ram expe­ri­ên­ci­as ao lon­go do dia, com o obje­ti­vo de garan­tir efi­ci­ên­cia máxi­ma das expor­ta­ções sem com­pro­me­ter a segu­ran­ça e o meio ambi­en­te, como é fun­ção da pra­ti­ca­gem. A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) tam­bém este­ve pre­sen­te com o dire­tor Francisval Mendes, além da dire­to­ria do Conselho Nacional de Praticagem (Conapra), rea­li­za­dor do evento.

– É impor­tan­te que haja essa tro­ca de infor­ma­ções com a apre­sen­ta­ção de novos temas. E o foco des­sa vez foi a pers­pec­ti­va de cres­ci­men­to da movi­men­ta­ção marí­ti­ma na Amazônia. A logís­ti­ca na expor­ta­ção da safra está vin­do para o Norte e a pra­ti­ca­gem pre­ci­sa conhe­cer os desa­fi­os estru­tu­rais e ambi­en­tais, para que pos­sa­mos trans­por­tar o volu­me pre­vis­to – afir­mou o dire­tor-pre­si­den­te do Conapra, o prá­ti­co Gustavo Martins, citan­do entre esses desa­fi­os as lon­gas dis­tân­ci­as das nave­ga­ções na região e as vari­a­ções gran­des de maré e do pró­prio rele­vo dos rios.

O vice-almi­ran­te Edervaldo Teixeira de Abreu Filho, coman­dan­te do 4º Distrito Naval, dis­se que está se for­man­do uma nova rota do agro­ne­gó­cio na hidro­via do Tapajós e que jus­ta­men­te os desa­fi­os do dis­tri­to o tor­nam bas­tan­te com­ple­xo. A uni­da­de é res­pon­sá­vel pela segu­ran­ça da nave­ga­ção na área dos esta­dos do Pará, Amapá, Maranhão e Piauí, tota­li­zan­do 900 milhas de lito­ral. Ele res­sal­tou o tra­ba­lho da pra­ti­ca­gem para a manu­ten­ção do bai­xís­si­mo índi­ce de acidentes.

– Entendo mui­to bem a impor­tân­cia do prá­ti­co para o Brasil. A pra­ti­ca­gem aju­da a Marinha na segu­ran­ça da nave­ga­ção. Quase não temos aci­den­tes – res­sal­tou o coman­dan­te, apro­vei­tan­do para anun­ci­ar que, em bre­ve, será assi­na­do um ter­mo de coo­pe­ra­ção com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) para fazer o levan­ta­men­to de toda a bar­ra nor­te do rio Amazonas e aumen­tar o calado.

O capi­tão de fra­ga­ta João Bittencourt Cavalcanti, dire­tor do Centro de Hidrografia e Navegação do Norte, des­ta­cou que é impor­tan­te sem­pre ouvir os prá­ti­cos sobre o melhor local de ade­qua­ção dos sinais náu­ti­cos, que são auxí­li­os à nave­ga­ção visual:

– Os prá­ti­cos podem opi­nar e con­tri­buir para que um sinal tenha a sua loca­li­za­ção alte­ra­da ou não.

A expe­ri­ên­cia da pra­ti­ca­gem já é com­par­ti­lha­da com a Academia. O pro­fes­sor dou­tor da USP, Eduardo Tannuri, fez um resu­mo do con­vê­nio do Conapra com a uni­ver­si­da­de, recém-reno­va­do, por meio do qual prá­ti­cos par­ti­ci­pam dos estu­dos de enge­nha­ria náu­ti­ca e por­tuá­ria em simu­la­do­res, refe­ren­tes às suas zonas de praticagem.

– Os prá­ti­cos conhe­cem a região onde atu­am, são fundamentais.

Quando essa expe­ri­ên­cia é pos­ta em xeque, os ris­cos aumen­tam, como aler­tou, no pai­nel ante­ri­or, o prá­ti­co Matusalém Gonçalves Pimenta, autor do livro “Praticagem, Meio Ambiente e Sinistralidade”. Ele cons­ta­tou o pro­ble­ma em sua tese, após ana­li­sar aci­den­tes: se há aumen­to no núme­ro de prá­ti­cos sem ofer­ta de ser­vi­ço que jus­ti­fi­que, eles pas­sam a mano­brar menos e per­dem em experiência.

– Infelizmente o Brasil vem des­cum­prin­do a reso­lu­ção A‑960 da Organização Marítima Internacional (IMO) que tra­ta do tema, o que é um con­tras­sen­so dian­te de todo o inves­ti­men­to que faze­mos em segu­ran­ça da nave­ga­ção. Quando a polí­ti­ca inva­de a deci­são téc­ni­ca, os ris­cos aumentam.

O prá­ti­co Luiz Antônio Raymundo da Silva, que abor­dou a influên­cia do fator huma­no na nave­ga­ção em águas res­tri­tas, con­tou como a pra­ti­ca­gem do Rio de Janeiro vem pro­cu­ran­do miti­gar o ris­co cita­do por Matusalém Gonçalves.

– Mudamos o trei­na­men­to e faze­mos uma ascen­são gra­du­al para quem está chegando.

Na área de logís­ti­ca, o pro­fes­sor dou­tor Hito Braga de Moraes, da Universidade Federal do Pará, apre­sen­tou um pro­je­to para supe­rar outro desa­fio da nave­ga­ção, o tama­nho das embar­ca­ções cada vez mai­o­res. Ele pro­põe a cons­tru­ção de um por­to offsho­re, fora do lito­ral. Esse ter­mi­nal mul­tiu­so seria um ali­men­ta­dor dos por­tos de Vila do Conde e Belém, já que hoje exis­te uma limi­ta­ção para ampli­a­ção por­tuá­ria por con­ta da exis­tên­cia de uma reser­va ambiental.

– No Panamá, já estão falan­do em ampli­ar o canal nova­men­te. Precisamos nos adap­tar para esses gran­des navi­os. A loca­li­za­ção do Pará é estra­té­gi­ca, per­to dos prin­ci­pais mer­ca­dos con­su­mi­do­res no Hemisfério Norte, e só o esta­do tem aces­so hidro­viá­rio, que é o mais bara­to. Podemos ser a por­ta de entra­da do Mercosul por­que o rio Amazonas já che­ga no Peru. Com algu­mas obras, pode­mos che­gar na Venezuela e na Colômbia. Podemos ter o mes­mo papel que Roterdã tem na Europa e inte­grar toda a América do Sul – suge­riu o pro­fes­sor, acres­cen­tan­do que é pos­sí­vel ain­da ter um clus­ter de manu­ten­ção naval no estado.

O capi­tão de fra­ga­ta Sebastião Simões de Oliveira, supe­rin­ten­den­te de Segurança da Navegação do Centro de Hidrografia da Marinha, fina­li­zou o encon­tro entre os pales­tran­tes, tra­zen­do as difi­cul­da­des de vali­da­ção dos levan­ta­men­tos hidro­grá­fi­cos exe­cu­ta­dos para pro­je­tos portuários:

– Todos os levan­ta­men­tos deve­ri­am ser infor­ma­dos à Autoridade Marítima. E esse é um pro­ble­ma com­pli­ca­do, pois sem essa infor­ma­ção não temos con­di­ções de ana­li­sar as car­tas náu­ti­cas, fun­da­men­tais para a segu­ran­ça da nave­ga­ção. Outro pro­ble­ma é que no Brasil não exis­te cur­so de enge­nha­ria hidro­grá­fi­ca. Por isso, encon­tra­mos falhas nos levan­ta­men­tos que avaliamos.