ARTIGO: E SE O ACIDENTE FOSSE COM UM GRANDE NAVIO?
No dia 9 de agosto, o Brasil assistiu à queda do avião que matou 62 pessoas. Mas e se o acidente fosse com um grande navio? Estamos preparados para lidar com suas consequências?
Navios carregam toneladas de combustível para se mover, quando não transportam cargas poluentes e explosivas. O Brasil não assinou as convenções de resposta a acidentes, instrumentos que garantem agilidade e recursos para combater a poluição e remover destroços.
O único arcabouço de que o país é signatário dá direito a US$ 8,9 milhões em acidente somente com petroleiro, valor que não cobre nem a multa ambiental. Trata-se da Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil por Danos Causados por Poluição de Óleo (CLC), de 1969. Ela foi criada após o acidente com o TORREY CANYON, na Grã-Bretanha, que transportava 119.328 toneladas de óleo.
O Brasil não ratificou a CLC de 1992, que ampliou os limites de indenização em 641%, e nem os fundos complementares, acionados quando os limites são extrapolados. A atualização da CLC passou a ser aplicável ao derramamento do óleo combustível do petroleiro e à zona econômica exclusiva (200 milhas náuticas da costa), enquanto a CLC-69 se aplica somente ao óleo enquanto carga e ao mar territorial (até 12 milhas).
Há ainda outras convenções de que o Brasil não é signatário. Para combater a poluição de produtos químicos, ácidos, gases liquefeitos e fertilizantes, surgiu a Convenção Internacional sobre Responsabilidade e Compensação por Danos Relativos ao Transporte por Mar de Substâncias Potencialmente Perigosas e Nocivas (HNS), de 1996.
Já a Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil por Danos Causados pela Poluição por Combustíveis de Navios (Bunker) se aplica ao derramamento de combustível de todo tipo de navio, exceto dos petroleiros tratados na CLC.
Por fim, a Convenção Internacional sobre Remoção de Destroços no Mar (Convenção de Nairobi), de 2007, acelera a remoção de naufrágios. Tivemos o HAIDAR, em 2015, cujo naufrágio com carga viva de bois causou impactos sociais e ambientais para ribeirinhos. Quase dez anos depois, a embarcação não foi removida do Rio Pará.
Acidentes assim exigem resposta rápida e recursos para evitar dano maior. O caso mais emblemático foi o do EXXON VALDEZ, no Alasca, em 1989. O óleo percorreu 2.200 quilômetros, custando em limpeza o equivalente à compra de 40 navios.
Temos um índice mínimo de incidentes em meio a mais de 80 mil manobras por ano. Sabemos, porém, que acidentes podem acontecer fora da zona de praticagem, por dispensa do serviço ou problemas alheios ao nosso controle, como condição ambiental inesperada ou mau funcionamento da embarcação. Aconteceu com o porta-contêineres que colidiu com a ponte em Baltimore, nos Estados Unidos, após sofrer apagões.
Os práticos vão a bordo para evitar acidentes evitáveis e minimizar as consequências dos inevitáveis. Não existe país capaz de garantir que não vá ocorrer acidente em suas águas. A comunidade internacional desenvolveu instrumentos para essas situações. Faltam assinaturas no papel.
Artigo do presidente da Praticagem do Brasil, Bruno Fonseca, publicado no jornal O Globo desta terça-feira, 20 de agosto: